História da Fundação

Fachada da Fundação Ezequiel Dias

A história da Fundação Ezequiel Dias está intensamente ligada ao desenvolvimento da Saúde Pública no país e especialmente em Minas Gerais. Suas ações, avanços e atividades têm raízes em uma das principais instituições de Ciência em Saúde do país, a Fundação Oswaldo Cruz.

Inaugurada em 3 de agosto de 1907, como a primeira filial do “Instituto Manguinhos”, hoje Fiocruz, representa a institucionalização do primeiro Centro de Pesquisa, Ciência e Saúde na nova capital mineira. A inauguração da filial foi reflexo de um dos objetivos de Oswaldo Cruz, de expandir os conceitos de ciência, e assim atender às demandas de saúde pelo interior do país, sendo Ezequiel Dias um dos grandes articuladores desse processo.


EZEQUIEL CAETANO DIAS

Nasceu na cidade de Macaé, estado do Rio de Janeiro, em 11 de maio de 1880. Aos dezesseis anos foi para a capital federal fazer o curso de Farmácia, para cumprir a vontade paterna. Ao terminar, telegrafou ao pai dizendo: “Acabo de fazer a sua vontade; vou agora cumprir a minha e terminar o curso médico”.

Antes de terminar o curso de Medicina, em 1902, foi selecionado para ser assistente de Oswaldo Cruz no Instituto Soroterápico, sendo um dos seus primeiros discípulos. Dedicou-se aos estudos da Microbiologia e da Medicina Experimental, participando ativamente dos trabalhos do Instituto. No ano seguinte, defendeu a sua tese “Hematologia Normal”, iniciando os estudos da “Hematologia” no Brasil.

Em 1904, fez parte de uma comissão, desenvolvendo estudos sobre o Beribéri e, em 1905, foi enviado para o Maranhão, como diretor de higiene, para instalar um completo laboratório de pesquisas e orientar os serviços de higiene pública no estado. Foi então que sua saúde começou a dar sinais de vulnerabilidade. Diagnosticado com tuberculose, Oswaldo Cruz solicita o seu retorno ao Rio de Janeiro. Por recomendação médica, Ezequiel é encaminhado para Belo Horizonte. Na época, a cidade era apreciada pelas características consideradas salubres para a vida do tuberculoso, como boa altitude, ventilação e clima ameno com baixa umidade. Belo Horizonte atraiu inúmeras pessoas com a doença.

Ezequiel se muda com a família para Belo Horizonte, em 1906. Quando apresenta melhora, é convidado por Oswaldo Cruz a instituir a primeira filial do Instituto Manguinhos do Rio de Janeiro, em Minas Gerais.

Ezequiel Caetano Dias
Ezequiel Caetano Dias

Aliado ao plano de Oswaldo Cruz de organizar caravanas técnicas e expandir os conceitos de saúde pública pelo país, estava a necessidade de tratamento médico de Ezequiel Dias contra a tuberculose. Belo Horizonte chamava a atenção na época pelo clima seco e montanhoso, ideal para o tratamento da doença. Por recomendação médica, mudou-se para a capital mineira.

Após a mudança, Ezequiel montou, em um dos quartos de sua residência, um pequeno laboratório de microbiologia para exames urgentes. Quando já se encontrava mais estabelecido, Oswaldo Cruz designou Ezequiel Dias para dirigir a primeira filial do Instituto Manguinhos do Rio de Janeiro, a ser instalada em Belo Horizonte.


A CIÊNCIA NA CAPITAL MINEIRA

A filial iniciou seus trabalhos na Rua da Bahia, onde hoje funciona a Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa, e seguia o mesmo modelo da matriz, combinando produção com pesquisa e ensino.

Primeira filial do Instituto Manguinhos do Rio de Janeiro na Rua da Bahia em Belo Horizonte. Foto: Acervo Funed

Nos primeiros anos, a atividade da instituição estava direcionada à produção de vacina contra diferentes moléstias humanas e animais, como a difteria, a varíola e o carbúnculo sintomático, também conhecido como peste da manqueira. Essa doença infectocontagiosa dizimava cerca de 60% dos bezerros, prejudicando o desenvolvimento do setor agropecuário do estado.

Em abril de 1910, Oswaldo Cruz faz uma visita à capital mineira e, após uma conversa com o diretor de higiene do Estado, Zoroastro Alvarenga, amplia o raio de atuação da filial e fortalece as atividades desenvolvidas pela Instituição, especialmente na realização de exames e diagnósticos de doenças e de higiene.

Para auxiliar as atividades veterinárias, foi cedido ao Instituto a Fazenda do Leitão, hoje a área em torno do Museu Abílio Barreto, no bairro Cidade Jardim, com a finalidade de instalar um Posto de Observação e Enfermaria Veterinária. No local, seriam realizados os exames dos animais suspeitos de doenças; o atendimento e auxílio aos criadores; e as experiências de profilaxia e terapêutica. Foram enviados dois discípulos de Manguinhos: Henrique Marques Lisboa, convidado a dirigir o Posto e, em 1912, Octávio Magalhães, para auxiliar nas atividades com as epizootias, como ajudante de microbiologia.

Apesar de Belo Horizonte se apresentar como uma cidade moderna e salubre, estava assolada por doenças e acidentes com animais peçonhentos que apareciam por toda parte e assustavam a população. No interior, os fazendeiros também passavam pelo mesmo problema com seus rebanhos, prejudicando o desenvolvimento econômico da região. Para auxiliar o estado e tentar resolver o problema com os animais peçonhentos, foi feito um acordo entre o governo de Minas, o Instituto Filial e o Instituto Butantan, para criação do primeiro Posto Antiofídico.

Em 1918, é inaugurado o Posto Antiofídico de Minas Gerais, anexo ao Instituto Filial de Manguinhos. As duas principais funções do posto eram: pesquisar o assunto referente às peçonhas e responder de maneira emergencial a uma demanda que surgia tanto da população quanto dos fazendeiros, que sofriam com os constantes acidentes.

A falta de espaço impossibilitou a produção imediata do soro antiofídico, pois a fabricação exigia complexidade técnica e estrutura. Assim, foi feito um contrato entre o estado de Minas e o Instituto Butantan de São Paulo, estabelecendo a expedição de veneno de serpentes, em troca de soro antiofídico. A filial mineira seria responsável pela extração do veneno das serpentes, em sua maioria enviadas pelos próprios fazendeiros. O material era então encaminhado ao enviado para o Instituto paulista, que enviava em troca o soro antiofídico para ser distribuído no estado. A partir de 1919, esse mesmo processo passou a ser feito com o Instituto Vital Brazil, de Niterói. Em 1935, o Instituto Ezequiel Dias passa a produzir o soro antiofídico.

O escorpionismo foi uma linha de pesquisa de destaque na instituição, devido à grande demanda social, pois os acidentes eram constantes e numerosos, se tornando um problema de Saúde Pública. O instituto desenvolveu inúmeros trabalhos inéditos sobre o assunto, pois não se achava na literatura referência às espécies encontradas em Minas Gerais: Tityus serrulatus (escorpião amarelo) e Tityus bahiensis (escorpião preto). Em 1920, a instituição inicia a produção do soro antiescorpiônico.

A biblioteca da filial do Instituto era outro ponto de destaque, criada para auxiliar as atividades e pesquisas desenvolvidas pelo Instituto. Ela foi além do seu projeto inicial, pois influenciou a construção do campo médico da cidade. Era ponto de encontro da elite médica belorizontina, que se encontrava semanalmente para discutir os artigos recém-chegados. O acervo era o que havia de mais moderno na literatura científica. Ezequiel Dias e Octávio Magalhães selecionavam e garimpavam as melhores publicações editadas pelos centros de ciência do mundo. Acreditavam que não bastava melhorar e equipar a filial, sendo preciso desenvolver e aperfeiçoar os recursos humanos da instituição, alicerce e receita para o progresso e o para o desenvolvimento. Por isso, a biblioteca não representava apenas um lugar de consulta, estudo ou informação, mas um local onde as discussões científicas aconteciam, as ideias brotavam e se fazia ciência.

Em 22 de outubro de 1922, Ezequiel Dias morre da doença que o assombrava. Muitas homenagens foram feitas por políticos e colegas, mas a de maior destaque foi atribuir seu nome à filial de Manguinhos de Belo Horizonte: Instituto Ezequiel Dias. Essa foi uma forma de reconhecer todo seu trabalho desenvolvido no Instituto e, ao mesmo tempo, consagrar-lhe definitivamente na história das ciências e da saúde de Minas Gerais e do país.

No ano seguinte, em 1923, segundo a vontade já manifestada em vida pelo próprio Ezequiel e apoiada por Carlos Chagas, foi feita a indicação de Octávio Magalhães como seu substituto na direção da Instituição, papel esse que Octávio já vinha assumindo ao longo dos anos.


OCTÁVIO COELHO DE MAGALHÃES

Nasceu na cidade do Rio de Janeiro, em 31 de janeiro de 1890. Aos 16 anos, ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, tendo como mentor Miguel Couto. No terceiro ano do curso médico, passou a frequentar o Instituto Soroterápico Federal, onde recebeu influência de Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Rocha Lima e outros. Em 1911, conclui o curso médico.

Em 1912, é convidado por Oswaldo Cruz a trabalhar no Posto de Observação e Enfermaria Veterinária na filial do Instituto, em Belo Horizonte. Nesse mesmo ano, conclui sua tese de doutorado em Fisiologia. No ano seguinte, é convocado a chefiar o laboratório central da Santa Casa de Belo Horizonte. Ao mesmo tempo, ainda com apenas 23 anos, é indicado por Ezequiel Dias a lecionar Fisiologia na recém-inaugurada Faculdade de Medicina de Minas Gerais.

Em 1920, Octávio atende ao pedido de Carlos Chagas para chefiar o Instituto de Higiene de Pelotas, no Rio Grande do Sul. Durante dois anos, Magalhães se dedica a reorganizar o instituto e lutar contra a febre tifoide, a tuberculose e a peste bubônica naquela região, além de promover ações de saneamento urbano.

Em 1922, Magalhães retorna às pressas a Belo Horizonte, a pedido de Ezequiel. Após a morte de Ezequiel, assume a direção da instituição.


SOB NOVA DIREÇÃO: OCTÁVIO MAGALHÃES 1923-1941

Ao assumir o cargo de diretor do Instituto Ezequiel Dias, Octávio Magalhães fez um estudo das possibilidades de crescimento e das necessidades da instituição. Começou a trabalhar procurando melhorar os contratos de venda de produtos e ampliou a produção de novas vacinas e soros, capazes de aumentar a renda e obter novos clientes.

As excursões científicas ao interior do estado foram outras medidas reforçadas, pois disseminavam informações sobre o Instituto e recolhiam material para estudos e para a coleção científica, além de pesquisar as enfermidades que assolavam o interior, como a doença de Chagas, difteria, febre aftosa,  escorpionismo e ofidismo, entre outras.

Atender às demandas do setor veterinário também era uma das atividades do Instituto e, aos poucos, Octávio Magalhães introduziu novos produtos para a melhoria da assistência e da renda. Dessa forma, começou a preparar sulfato de cobre para tratamento da febre aftosa, a vacina contra o “mal triste das aves” (tifose aviária), o soluto de urotropina para epitelioma das aves e a vacina contra a pneumonterite dos bezerros. Ações que favoreciam e melhoravam o desenvolvimento econômico e social e social do estado.

Octávio Magalhães conseguiu implantar no Instituto várias seções dedicadas a pesquisas de vírus, protozoologia, bacteriologia, anatomia patológica, imunologia, entomologia, química pura ou biológica e diversas atividades. Promoveu a capacitação dos técnicos e trouxe pesquisadores qualificados para desenvolver as novas seções de pesquisa. Dentre eles, Paulo Diniz Carneiro para a seção antirrábica, Waldermar Versiane para a protozoologia, Amílcar Martins para pesquisa da doença de Chagas e hemípteros, e muitos outros. Apesar dos pesquisadores se dedicarem a algumas pesquisas especificas, não havia linhas fixas. Trabalhavam nas demandas urgentes do estado e acumulavam diversas funções no seu cotidiano, como as análises de doenças, a produção de vacinas e a pesquisa científica.

O Instituto sempre exerceu papel de destaque na construção e desenvolvimento das demandas em Ciência e Saúde no estado. Seu prestígio era reconhecido nacional e internacionalmente, recebendo constantemente grandes personalidades, incluindo a então princesa Elisabeth da Inglaterra, o rei Alberto da Bélgica e inúmeros pesquisadores, médicos, professores, chefes de estado, cônsules e desembargadores, que queriam conhecer suas atividades e visitar suas dependências.

A década de 1930 foi marcada por medidas intervencionistas e centralizadoras, que mudaram a política e a economia do país, e causaram transformações que marcaram a história e a gestão das instituições de ciência. O Instituto Oswaldo Cruz, do Rio de Janeiro, sofreu fortes impactos com o novo modelo, principalmente com a perda de autonomia administrativa e financeira, e com a proibição de fabricar produtos veterinários, atitudes que interferiram diretamente na sua relação com a filial. As dificuldades no repasse de verbas para o Instituto mineiro e a pressão do governo estadual por um instituto próprio, no qual pudesse direcionar e conduzir as atividades de pesquisa e produção, levaram à estadualização do Instituto Ezequiel Dias.

Assim, em 1936, por meio da Lei nº 164, o governo federal opta por passar o Instituto Ezequiel Dias para a esfera estadual, denominando-o Instituto Biológico Ezequiel Dias. A estadualização inaugurou uma nova fase no Instituto, com a criação do seu primeiro regulamento, dado por meio do Decreto 886, de 1937, e sua transferência para a Fazenda Gameleira, finalizada em 24 de julho de 1941. O Instituto Ezequiel Dias então assume definitivamente seu papel e finalidade de orientar o governo de Minas no que tange às doenças infectocontagiosas, no preparo de produtos biológicos, no combate às moléstias humanas, de animais e de plantas.

Serpentário externo no Instituto. Foto: Acervo Funed

A MUDANÇA PARA A SEDE ATUAL: A GAMELEIRA

A sede da Rua da Bahia não comportava o crescimento institucional. O espaço estava pequeno para as diversas demandas e atividades desenvolvidas, sendo necessário um lugar maior. Ao mesmo tempo, a região em torno do Palácio do Governo sofria uma rápida urbanização e valorização imobiliária. A pressão social para a saída do Instituto da região era grande. Havia várias reclamações com relação ao mau cheiro dos animais, além do medo dos micróbios e das doenças que eram estudados ali. Por fim, a campanha teve seu efeito. A instituição mudou-se para a Fazenda Gameleira, longe do perímetro urbano e da Avenida do Contorno.

A instituição mudou-se para a Fazenda Gameleira, longe do perímetro urbano e da Avenida do Contorno
Obras da sede atual da Fundação. Foto: Acervo Funed

Com a transferência do Instituto para a Fazenda Gameleira, o governo de Minas Gerais tinha como objetivo ampliar e remodelar suas atividades. Assim, aumentou a produção de soros, vacinas, produtos químicos e biológicos para hospitais e para as campanhas sanitárias dentro e fora de suas fronteiras. Apesar da nova organização, Octávio Magalhães mantinha relação contínua com o Instituto Oswaldo Cruz.

A construção da nova sede na Fazenda Gameleira não foi uma tarefa fácil. Magalhães planejava fazer uma instituição grandiosa e modelar no estado de Minas, com diversas atividades e pavilhões de pesquisa e produção, além de cooperação técnica com instituições de Ciência e Ensino, como a Escola de Veterinária.

Foi edificado um pavilhão central e mais cinco unidades. Cada estrutura abrigaria uma especialidade, como a vacina antivariólica, o tifo exantemático (hoje, febre maculosa), a febre amarela, a raiva e outras doenças. Na entrada do Instituto, foram construídos dois serpentários para abrigar as serpentes. Na seção de produtos fabricados, havia uma parte para expedição e outra para venda a varejo. A nova organização do Instituto mantinha vivos os mesmos conceitos de Ciência e Saúde Pública herdados de Oswaldo Cruz, além do princípio básico da sua criação: produção com pesquisa e ensino.

Em 20 setembro de 1941, foi publicada uma reforma radical do Instituto Biológico Ezequiel Dias, mudando toda a sua estrutura administrativa e gerencial. O governador Benedito Valadares nomeia seu primo Antônio Valadares Bahia para o cargo de diretor geral do Instituto e Octávio Magalhães para diretor técnico. Magalhães não aceita o cargo e se desliga da instituição, que teve seu nome alterado para “Instituto Bioquímico”, depois “Instituto Químico-Biológico” e, mais tarde, “Instituto de Higiene”. No governo de Juscelino Kubitschek (1951-1955), passou novamente a chamar-se “Instituto Ezequiel Dias”.

Octávio Magalhães entregou ao estado de Minas Gerais uma instituição em plena produção intelectual e de produtos, cujo saldo econômico era positivo, com dívida pequena e lucros promissores, sendo uma das maiores instituições de Pesquisa, Ciência e Saúde em prol do bem-estar social. A reforma realizada pelo governo mineiro limitou as atividades de pesquisa e concentrou as demandas no sistema produtivo, silenciando os princípios da sua identidade fundadora.


NOVAS DEMANDAS

A década de 1950 é marcada pelo predomínio das atividades produtivas, em detrimento das atividades de pesquisa e análise. As expedições científicas pelo interior do Estado não aconteciam mais e a biblioteca, centro da cultura científica, aos poucos foi se tornado obsoleta.

Neste momento, o Instituto suspende a fabricação de produtos veterinários, como as vacinas contra febre aftosa, bouba aviária e pneumoenterite dos bezerros, dentre outros produtos voltados para o uso em animais, e investe na fabricação de produtos farmacêuticos para a saúde humana. Em 1959, a fábrica de sulfonas do Departamento Estadual de Lepra é instalada no Instituto para atender à demanda de antilepróticos do estado e de outras regiões do país.

Na década de 1960, as atividades desenvolvidas pelo Laboratório de Produtos Farmacêuticos do Instituto Ezequiel Dias são ampliadas para atender à demanda do estado, dando início à produção de medicamentos essenciais de baixo custo. Inicia-se um novo ciclo de produção e gerenciamento industrial. Dentre os medicamentos fabricados, podemos citar: ácido acetilsalicílico, adipato de piperazina, antianêmico, fosfato de codeína, codeína em gotas, fenobarbital, metapirina, dipirona, cálcio, sulfadiazina, sulfato ferroso, vitamina B1 e xarope piperazina, dentre outros, como água destilada, soro fisiológico e soro glicosado isotônico.

Na mesma época, a seção de bacteriologia também foi ampliada para atender aos exames especializados do Instituto Galba Veloso, do Dispensário Central, do Sanatório Estadual Eduardo de Menezes, hoje Hospital Eduardo de Menezes, do Dispensário Antituberculoso, hoje Hospital Júlia Kubitschek, e de outros órgãos. Em 1967, o Instituto fornecia ao estado de Minas Gerais produtos químicos e biológicos, tais como vacinas, soros, medicamentos, além de análises diagnósticas e algumas atividades de pesquisas.


NASCE A FUNDAÇÃO EZEQUIEL DIAS

A década de 1970 foi um período de grandes transformações para a instituição. No cenário nacional, a política de Saúde Pública passava por processos de mudanças na assistência médico-social e na forma de financiamento das ações em saúde.

Funed vista da Rua Conde Pereira Carneiro, na Gameleira. Foto: Acervo Funed

Nessa perspectiva, o estado de Minas Gerais promulgou a Lei 5.594/1970, que institui a Fundação Ezequiel Dias (Funed), que integrava o Instituto Ezequiel Dias e a Escola de Saúde Pública. Nesse momento, são criados departamentos técnicos, de produção industrial e de planificação e aplicação à saúde.

Em 1973, devido à confusão de nomes entre a Fundação Ezequiel Dias e o Instituto Ezequiel Dias, o Instituto passa a se denominar Instituto Octávio Magalhães, em homenagem ao seu antigo diretor, falecido no ano anterior.

A década de 1970 foi um período com significativos investimentos na indústria farmacêutica. O governo federal criou a Central de Medicamentos (Ceme), com o objetivo de fornecer medicamentos essenciais à população. A Funed se tornou um dos laboratórios oficiais e passou a receber apoio técnico, equipamentos e recursos financeiros. Em contrapartida, a produção industrial era direcionada à Ceme. A política governamental permitiu que a Fundação desenvolvesse um sistema fabril de medicamentos básicos para a Saúde Pública. A fábrica de medicamentos era operacional e muito produtiva, conseguindo ficar em terceiro lugar na produção nacional de fármacos.

As produções de soros antiofídicos e antiescorpiônico não tiveram o mesmo incentivo. A instituição tinha uma produção muito baixa, devido à falta de investimento dos governos federal e estadual, pois o fornecimento do produto estava a cargo do laboratório privado “Syntex do Brasil”, empresa incorporada pela Biolab Searle.

Ao mesmo tempo em que a política de assistência farmacêutica tinha grandes investimentos, a política de controle de doenças teve seus investimentos reduzidos, resultando no surgimento de epidemias e na piora das condições de saúde da população. Em 1974, um surto de meningite assolou o país. Em 1976, o Ministério da Saúde criou Laboratórios Centrais de Saúde Pública em cada estado, com o objetivo de centralizar as informações e demandas de análises laboratoriais. A Rede foi oficializada em 1977, como o Sistema Nacional de Laboratórios de Saúde Pública. O Instituto Octávio Magalhães da Fundação Ezequiel Dias foi instituído como o Laboratório Central de Saúde Pública de Minas Gerais (Lacen/MG). Ao longo do tempo, e conforme as demandas de Saúde Pública, os laboratórios do IOM foram acrescentando análises em seu escopo, como a tuberculose e, em seguida, a cólera.

Na mesma época, foi promulgado o Decreto Lei 986, que “regula a defesa e a proteção da saúde individual ou coletiva, no tocante a alimentos, desde a sua obtenção até o seu consumo”. Inicialmente, as análises eram realizadas para o controle de qualidade dos alimentos. Após o Decreto, todos os alimentos e bebidas poderiam ser consumidos ou vendidos após o registro no Laboratório Central de Controle de Drogas, Medicamentos e Alimentos do Governo Federal. Nesse sentido, as atividades do serviço de Bromatologia foram reestruturadas e o laboratório foi credenciado para realizar as análises, o controle e a fiscalização dos alimentos a serem regulamentados. O Laboratório de Águas também teve suas atividades ampliadas e novos equipamentos foram adquiridos, juntamente com a qualificação do pessoal para execução das atividades.

No Brasil, o final da década de 1970 acenava para uma abertura política lenta, gradual e segura, que levaria o país à redemocratização. O turbilhão de movimentos no país se refletia nos andamentos das atividades institucionais. Neste momento, a Funed apresentava números recordes de produção de medicamentos. Trinta especialidades eram fabricadas e a capacidade de produção passou de 15 milhões de unidades para 180 milhões. Porém, o crescimento institucional se apresentava frágil e irregular.

O início da década 1980 foi marcado por momentos de incertezas na Funed. Porém, em 1983, ocorrem novas mudanças no cenário nacional. Houve uma crise na produção de soros antiofídicos no Brasil, devido à paralização das atividades do laboratório privado “Syntex do Brasil”, por determinação do Ministério da Saúde, que detectou falhas no processo de produção. Em seguida, o laboratório deixou o país. Esse fato fez com que o atendimento da demanda nacional ficasse a cargo dos três laboratórios oficiais que também eram produtores do soro antiofídico: o Instituto Butantan, de São Paulo, o Vital Brazil, do Rio de Janeiro, e a Funed, em Minas Gerais. Para tanto, os governos federal e estadual investiram na reestruturação da instituição, a fim de recuperar e ampliar a produção de soros antiofídicos e antiescorpiônico.

Dentro dessa linha, a Funed convidou o médico bioquímico e pesquisador Carlos Ribeiro Diniz, um dos consultores do trabalho de reestruturação, para recuperar as atividades de pesquisa científica e tecnológica, uma das principais diretrizes da instituição desde a sua criação, e auxiliar na reorganização da produção de soros. Em 1984, cria o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento, hoje Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento (DPD), com linhas de pesquisa relacionadas a veneno de animais peçonhentos, incluindo as aranhas.

No mesmo ano, a Funed recebe do governo estadual, como doação, a Fazenda São Judas Tadeu, em Betim, para ampliar o plantel de cavalos utilizados na produção de imunobiológicos.


CARLOS RIBEIRO DINIZ

Nasceu em Minas Gerais, na cidade de Luminárias, no dia 2 de fevereiro de 1919. Filho de fazendeiro, desde criança apresentava vocação para a ciência.

No final da década de 1930, se muda para Belo Horizonte e ingressa na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais (nomenclatura dada, na época, para a Universidade Federal de Minas Gerais). Logo se interessou pela Fisiologia, matéria ministrada pelo professor Baeta Vianna, um dos pioneiros da pesquisa experimental no Brasil.

No terceiro ano do curso médico, Diniz é convidado por Baeta Vianna para trabalhar no seu laboratório. A geração do prof. Baeta foi a primeira a usar a bioquímica moderna em laboratórios clínicos em Belo Horizonte. Quando concluiu o curso médico, em 1943, foi convidado a ser seu assistente na Faculdade.

Em 1948, defendeu a tese de livre docência sobre enzimas proteolíticas da tireoide e, no mesmo ano, é convidado por Baeta Viana para trabalhar no Instituto Biológico de São Paulo e na Escola Paulista.

Na década de 1950, foi chamado por Zeferino Vaz para trabalhar em Ribeirão Preto com veneno de serpentes e de escorpião. Na época, não se conhecia a natureza química da peçonha, principalmente do Tytius serrulatus. Ao mesmo tempo, se dedicava ao projeto da bradicinina com Rocha e Silva, publicando-o em uma das principais revistas científicas, a Nature. O método apresentado era tão inovador que até hoje está em vigor.

Na década de 1960, é convidado para o cargo de chefe do departamento de Bioquímica da Faculdade de Medicina de Minas Gerais no lugar de Baeta Viana, que havia se aposentado.

Em 1975, a partir de projetos do curso de pós-graduação em Biotecnologia da UFMG, foi criada a Biobrás, empresa para produção de enzimas, em Montes Claros (MG).

Na década de 80, Diniz começa a rearticular uma antiga ideia de criar uma fundação de amparo à pesquisa científica em Minas, nos moldes da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Com a ajuda da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), vários pesquisadores e políticos, a Fundação de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) é criada em 1985, já com recursos.

Nesse mesmo período, é convidado pelo governador Tancredo Neves a assumir a superintendência da Fundação Ezequiel Dias, na tentativa de reestruturar e recuperar o prestígio científico da instituição. Na impossibilidade de assumir a direção da Funed, Carlos Diniz fica como assessor técnico e cientifico e mais tarde como diretor do Centro de Pesquisa da instituição. Consegue recursos por meio do Programa de Apoio do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PADCT) para reativar os laboratórios de pesquisa e introduz os trabalhos com venenos de peçonhas. Reformula e moderniza o processo de produção de soros da Funed e cria várias linhas de pesquisa relacionadas a veneno de peçonhas.

Em 2002, Carlos é vitima de um acidente vascular cerebral e morre aos 83 anos, em plena atividade científica.


A CRIAÇÃO DO SUS

A promulgação da Constituição Federal, em 1988, foi um dos mais importantes avanços obtidos na história brasileira, pois restabelece a liberdade, os direitos e as garantias civis. Dentre os objetivos sociais da Constituição, está a criação do Sistema Único de Saúde (SUS). A saúde passou a ser um direito do cidadão e um dever do estado, que deveria garanti-la por meio de políticas sociais e econômicas. A Lei Orgânica nº 8080/90, que regulamenta o SUS, propõe a organização das ações e dos serviços de saúde, dentre elas a assistência farmacêutica.

A partir desse novo cenário nacional, a Fundação Ezequiel Dias teve que adaptar-se às novas diretrizes. Foi implantado um programa de qualidade na instituição, visando à utilização de novos métodos de gestão e mudanças comportamentais na organização do trabalho.

Na produção industrial, foi implantado um programa de modernização, que contemplava a expansão da área física e a compra de novos equipamentos. No setor de líquidos, o processo foi otimizado e, no setor de sólidos, foi feita a readequação do sistema fabril, no qual a intervenção humana era indireta. Foi implantado, também, o Laboratório de Desenvolvimento Farmacotécnico e estavam em fase de projeto o desenvolvimento e a fabricação de fitoterápicos. Nesse período, 40% da produção eram destinadas às Secretarias de Estado e Municipais de Saúde e os outros 60% ao atendimento do cronograma da Central de Medicamentos (CEM). O programa da CEM é encerrado em 1997.

O Instituto Octávio Magalhães (IOM) implantou novos serviços para dar suporte às ações em saúde coletiva, como o Laboratório Físico-Químico de Água, o Laboratório de Virologia, o diagnóstico da fenilcetonúria, o diagnóstico laboratorial da febre maculosa e o diagnóstico sorológico de sarampo.

Durante esse período, o IOM foi reconhecido por órgãos nacionais e internacionais da saúde como Referência Nacional para a doença de Chagas. Dentro do projeto de controle de endemias no Nordeste, era também Referência Nacional para micotoxinas, além de ser participante da Vigilância Internacional de Riquetsioses.

Fabrica de medicamentos
Medicamentos no Laboratório de Desenvolvimento Farmacotécnico em 1988. Foto: Acervo Funed

A Diretoria de Pesquisa se constituía como um centro de excelência em pesquisa e desenvolvimento tecnológico, responsabilizando-se pelas pesquisas fundamentais de substâncias biologicamente ativas, apesar da falta de recursos humanos capacitados e de uma estrutura física adequada. A maioria das atividades era financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig).

Desde a criação do SUS, os serviços de saúde no Brasil vêm passando por importantes transformações. Dentre elas, estão a Política Nacional de Medicamentos (PNM), que traça as principais diretrizes para a assistência farmacêutica, a atualização regular da Relação Nacional de Medicamentos (Rename) e a promoção do uso racional de medicamentos. Além dessas ações, pode-se destacar, em 1999, a criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para fiscalizar e garantir os serviços e produtos da saúde e a lei dos genéricos, que garante o acesso da população aos medicamentos essenciais por um preço reduzido.

Em conformidade com o projeto do Governo Federal, a Funed alinha suas diretrizes e, em 1997, dentro do Programa de Assistência Farmacêutica, implanta o projeto Farmácia Essencial, que objetivava distribuir gratuitamente, aos municípios, medicamentos essenciais. A produção industrial passou de 700 mil unidades para dois milhões e foi aprovada a construção da nova fábrica para produção de cápsulas.

Nesse mesmo período, o IOM amplia suas técnicas com o trabalho de isolamento do vírus da dengue e foi indicado pelo Ministério da Saúde para ser um dos laboratórios oficiais de análise dos medicamentos genéricos, inaugurando assim o Laboratório de Análise de Medicamentos.

Em 1999, na área de pesquisa, o enfoque estava direcionado para a bioquímica, química de proteínas, imunologia, biologia molecular, virologia, cultivo celular e farmacologia. No desenvolvimento de produtos, o enfoque eram os biológicos, síntese orgânica, diagnóstico molecular e imunoquímica. Nesse mesmo ano, a Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento inaugura o novo prédio, melhorando sua infraestrutura e ampliando suas atividades.

Laboratório de Biossegurança
Unidade de Garantia da Qualidade e Biossegurança do Instituto Octávio Magalhães, em 2000. Foto: Acervo Funed

No ano 2000, o IOM cria a Unidade de Garantia da Qualidade e Biossegurança, para auxiliar os laboratórios na certificação e registros. Vários cursos foram implantados, como auditoria em sistemas de qualidade em laboratórios, metrologia, calibração, validação e normas técnicas. Manuais e procedimentos operacionais foram implementados.

Na mesma época, foi criada a Rede Estadual de Laboratórios de Saúde Pública de Minas Geral (Relsp/MG), coordenada tecnicamente pelo IOM. A rede tinha a função de sistematizar a regionalização e a hierarquização, seguindo as diretrizes do SUS, para algumas análises e diagnósticos de baixa complexidade, como água, dengue, HIV, leishmaniose e malária. Essas atividades foram descentralizadas para os Laboratórios Macrorregionais criados em Juiz de Fora, Montes Claros, Pouso Alegre, Teófilo Otoni e Uberaba.

Em 2003, a Funed implanta o Sistema de Gestão Integrada, elabora o planejamento estratégico e adota metas específicas e indicadores de desempenho para todas as unidades administrativas da instituição. A missão, a visão e os valores institucionais foram estabelecidos e vários cenários de desenvolvimento foram projetados.

Durante esse período, vários programas e atividades foram implantados e desenvolvidos na instituição. Dentre eles, o Programa de Bolsa de Iniciação Cientifica, a criação do Núcleo de Inovação Tecnológica e Proteção do Conhecimento, a habilitação de ensaios pela Rede Brasileira de Laboratórios Analíticos em Saúde (Reblas), o depósito de pedidos de patentes, o desenvolvimento de kits diagnósticos, a implantação do Laboratório de Biossegurança NB3, dentre os poucos no país, a inauguração da fábrica de antibióticos, além da produção recorde de medicamentos, com mais de um bilhão de unidades.


UMA FUNDAÇÃO CENTENÁRIA

Produção - DI
Produção de medicamentos Funed em 2010. Foto: ACS Funed

Em 2007, além de completar 100 anos, a Funed entra em uma nova fase, com a realização do primeiro concurso público que permitiu a ampliação de servidores efetivos. Nesse mesmo ano, a Escola de Saúde Pública se desvincula da Fundação e passa a ter autonomia administrativa. Em 2008, a cultura da qualidade já era uma realidade na Fundação e, nesse ano, a Instituição recebeu a certificação da Organização Nacional de Acreditação (ONA) e a certificação na Norma ISO 17025 e 17023, para diversos ensaios destinados aos Laboratórios Públicos de Minas Gerais e do país. Em 2010, a Funed foi certificada pela ISO 9001 e, em 2011, o Instituto Octávio Magalhães (IOM) foi o primeiro laboratório brasileiro pré-qualificado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como referência no controle de qualidade de medicamentos para o continente americano.

Na produção industrial, em 2009, foi firmada a primeira parceria com a suíça Novartis, hoje GSK, para a transferência de tecnologia da vacina contra a meningite C, que passou a integrar o Programa Nacional de Imunização (PNI), em 2010. Em 2012, foi criado o Programa Ciência em Movimento, com um caminhão que viaja pelos municípios mineiros popularizando a ciência e levando conceitos de saúde e cultura a estudantes e profissionais de saúde, por meio de uma linguagem lúdica e popular, com uma exposição itinerante.